Amizade é uma interação íntima, espontânea e recíproca entre
duas pessoas, intermediada pela afetividade. É uma relação na qual se dar e recebe
amor espontaneamente. Não existe nada que obrigue alguém ser amigo de outra
pessoa. É algo radicalmente espontâneo e absolutamente natural. É tão natural
que faz parte da própria natureza humana ter amizades. Todos nós precisamos de
alguém para custodiar a nossa alma. Não podemos viver no isolamento, timbrado
pela solidão. Foi o próprio Deus disse: “não é bom que o homem esteja só” (Gn
2. 18).
Por
isso que apesar do egoísmo humano, das falsas amizades, da hipocrisia de muitas
pessoas, da ingratidão de alguns, não podemos desistir da verdadeira amizade.
Ainda é possível ter amigos. Eles são indispensáveis á nossa vida. Não podemos
ter felicidade e vida saudável sem constituir amigos. Aristóteles, um dos grandes pensadores grego,
nos livros VIII e IX da Ética de Nicômaco, diz que amizade é uma virtude
necessária e indispensável à vida, muito mais importante que riquezas e poder.
Pois nada na vida tem sentido sem amigos.
A
literatura científica também reconhece a amizade com um importante ponto de
felicidade e de bem-estar, pois proporciona compartilhamento de experiências,
interesses, sentimentos e emoções. Pesquisas dão conta que o fator que mais
influencia na saúde física e emocional das pessoas são os amigos. Não é o
dinheiro, não é a genética, nem mesmo a alimentação. As boas amizades diminuem
o risco de doenças cardiovasculares, diminuem o estresse e proporciona o
sentimento de bem-estar e longevidade. Segundo uma matéria publicada pela
Revista Superinteressante, as boas amizades podem nos dar um saldo de uma
década a mais de vida[1].
Muito
antes da ciência e da filosofia, a Bíblia já apontava a amizade com fonte de
saúde para a alma e para corpo. Escreve Salomão: “o olhar de um amigo alegra o coração e as boas novas fortalece até os
ossos” (Pv 15. 30) Os amigos nos tiram da solidão, evitam o tédio e enchem
nossa alma de felicidade. Um amigo de
verdade é tão precioso, que muitas vezes ele é mais próximo que um irmão. Ele
faz parte de nossa intimidade. Diz Salomão: “o homem que tem muitos amigos pode congratular-se, mas há amigo mais
chegado que um irmão” (Pv 18. 24). Esse tipo de amigo de amigo potencializa
nosso crescimento, não nos deixa sentir inútil, e nos desafia a continuar
exercendo nossa missão com eficiência. Diz em Provérbio: “como o ferro com o ferro se aguça, assim o homem afia o rosto do seu
amigo” (Pv 27. 17).
Amizade
é tão importante, que o próprio Deus se relacionou com alguns de seus servos
amigavelmente. Moisés é um exemplo. Ele
tinha uma profunda intimidade com Deus. “Falava o SENHOR a Moisés face a face,
como qualquer fala com o seu amigo” (Ex 33. 11). Eles dialogavam de frente um
com o outro, “face a face”, sem intermediário, abertamente. Moisés tinha
liberdade para falar com Deus e Deus tratava Moisés amorosamente.
Abraão
é outro exemplo. Ele é chamado de Amigo de Deus. Escreve Tiago: “e creu Abraão
em Deus, e foi-lhe isso imputado como justiça, e foi chamado amigo de Deus” (Tg
2. 23). Ele se torna amigo de Deus por causa de sua fé. A fé de Abraão era a
base de sua amizade com Deus. O rei Josafá o considera o amigo perene de Deus
(II Cr 20. 7). O próprio Deus o chama particularmente de “meu amigo” (Is 41.
8); expressão essa que pode ser traduzida por “a quem tenho amado. Isso mostra
que Abraão era querido, amado e aceito por Deus. Que privilégio extraordinário
ser chamado pelo próprio Deus de “meu amigo”.
Amizade
é indispensável de tal forma que Jesus não limitou seu relacionamento conosco a
uma relação de Senhor e servo. Jesus não nos trata simplesmente com o seus
súditos. Ele nos trata como amigos. Jesus mesmo disse: “já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu
senhor, mas tenho vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos
tenho feito a conhecer” (João 15. 15). Jesus é o maior amigo! Ninguém
poderia nos ajudar a escapar da condenação eterna; mas Cristo com o seu imenso
amor, nos salvou e nos fez os seus amigos. Tirou-nos da posição de servo, de
simples escravo, e nos elevou à posição de seus iguais, à dignidade de amigo,
considerando-nos companheiros seus.
No
entanto a amizade com Cristo tem um preço. Requer absoluta obediência aos seus
mandamentos. “Vós sereis meus amigos, se fizerdes o que eu vos mando” (Jo 15.
14). Cristo deu a vida por nós (Jo 15. 13). Mas em contra partida, ele requer a
nossa sujeição ao que ele manda. Os amigos de Cristo segue a ética de Cristo e
tem a mente de Cristo (I Cor 2. 16). Pensa como Cristo pensa (Fl 4. 8), sente
como Cristo sente (Fl 2. 5) e anda como Cristo andou (I Jo 2. 6). Os amigos de
Cristo têm a imagem e a semelhança de Cristo ( Rm 8. 29)
Porque
o verdadeiro amigo é alguém que tem alma semelhante a nossa. Em Deuteronômio
13. 6 está escrito: “teu amigo, que te é como a tua alma”. Significa dizer que
o amigo se identifica com o nosso interior. É uma ligação de almas. A alma dele
é como a sua, com atitudes concordantes e afetos similares. É aquela pessoa que
tem sentimentos e pensamentos semelhantes aos seus e quando diferentes, não são
motivos de separação. Pois na verdadeira amizade as almas se unem, há afeição e
solidez. O amigo é alguém que não é você, mas que você se identifica a si mesma
nela. Segundo Aristóteles, amizade “são dois corpos que compartilham a mesma
mente”. Talvez um pouco exagerado, Montaigne escreve: “amizade a que me refiro
[...] as almas entrosam-se e se confundem em uma única alma, tão unida uma à
outra que não se distinguem, não se lhes percebendo sequer a linha de
demarcação” (MONTAIGNE 1972. P. 179, 180).
O
verdadeiro amigo é alguém diferente de você, mas que te completa, pois tais
diferenças tornam um completo um do outro.
Por isso que na verdadeira amizade se aceita a pessoa do jeito que ela
é. Não se aproxima do outro pelo que ele possui, mas pelo que ele é. A límpida
amizade se baseia no ser e não no ter.
O
verdadeiro amigo nos deixa confortável na relação, proporcionando liberdade.
Adiante do amigo ficamos livres para expressar, brincar, rir e chorar. Adiante
de um verdadeiro amigo podemos pensar em alta voz, podemos ser sinceros e
deixar aberta a porta do coração. O verdadeiro amigo não é necessariamente
aquele que compreende a nossa dor, nosso sofrimento ou as nossas decepções, mas
aquele que não nos abandona em nossa dor e em nossas decepções. É bem provável
que amizade seja o ponto mais alto das relações sociais. Na corte dos Ptolomeus
“Philo” ‘amigo’ era o título dado ao mais alto dos oficiais do rei.
Um
exemplo bíblico de uma límpida amizade é Jônatas e Davi. A entrevista de Saul a
Davi, depois da vitória contra o famoso gigante Golias, pôs Jônatas em contanto
com Davi, nascendo daí uma grande amizade entre os dois. O texto bíblico diz:
“e sucedeu que, acabando ele de falar com Saul, a alma de Jônatas se ligou com
a alma de Davi; e Jônatas o amou com à sua própria alma” (I Sm 18. 1). Suas
almas foram costuradas uma á outra pela linha do amor. Eles estavam ligados
como papel colado um no outro. Eles amavam um ao outro como á sua própria alma.
Eles gostavam um do outro como a si mesmo. O amor que sentia por si mesmo era o
amor com que amava ao outro.
Amizade
entre os dois era tão ampla que eles selaram um pacto de mútua lealdade,
proteção e apoio (I Sm 18. 2). E como demonstração desse profundo e amplo
afeto, Jônatas deu a Davi todas as suas armas de guerra. Ele tirou a capa que
trazia sobre si e deu a Davi, como também suas vestes, sua espada, seu arco e
seu cinto[2] (I Sm 18. 3). Amizade
entre os dois era tão profunda, que quando Jônatas morreu, Davi cunhou a
seguinte lamentação: “angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; quão
amabilíssimo me eras! Mas maravilhoso me era o teu amor do que o amor das
mulheres” (II Sm 1. 26).
É claro
que é preciso tomar cuido com as falsas amizades. Assim como existem os
verdadeiros amigos, existem os falsos. São pessoas que não são amigos do seu
ser, mas do que você possui. São os chamados amigos utilitaristas. Conhecidos
popularmente como amigos interesseiros. A pessoa é sua amiga porque percebe que
pode tirar algum proveito seu. Salomão, o rei da sabedoria, muitos antes de nós,
escreveu claramente sobre esse tipo de amizade: “O pobre é aborrecido até do companheiro,
mas os amigos do rico são muitos” (Pv 14. 20); “as riquezas granjeiam muitos amigos, mas ao
pobre o seu próprio amigo o deixa (Pv 19. 4); “e cada um é amigo daquele que dá
presentes. Todos os irmãos do pobre o aborrecem; quanto mais se afastarão dele
os seus amigos! Corre após eles com palavras, mas não servem de nada” (Pv 19. 6,
7). São pessoas de elogios exagerados e inoportunos (Pv 27. 14).
Contudo
não podemos nos isolar e deixar nosso coração solitário por causa das decepções
com algumas amizades. Isso aconteceu com Jesus. Ele foi traído pelo seu amigo
íntimo, quem tanto ele confiava (Sl 41. 9). Judas era um dos discípulos mais
próximo de Cristo. Traiu Jesus por trinta moedas de prata. Contudo Jesus não
desistiu de constituir amizades. Ele nos fez seus amigos.
Faça
como Jesus! Não deixe de constituir novas amizades e nem abandone os seus
amigos. Salomão sabiamente aconselha: “Não abandones o teu amigo, nem o amigo
do teu pai” (Pv 27. 10). Um pouco antes ele escreve: “em todo tempo ama o amigo e angústia nasce o irmão” (Pv 17. 17). Jamais
se deve zombar (Jó 16. 20); caluniar (Jr 9. 4), condenar (Jó 32. 3) difamar (Pv
16. 28), lisonjear indevidamente (Pv 27. 14), ferir (Zc 13. 6) e afastar-se dos
amigos, principalmente nos momentos de aflição. Assim expressou Jó: “ao que
está aflito devia o amigo mostrar compaixão” (6. 14). Os amigos devem ser
cultivados com amor, lealdade, fidelidade e oração (Jó 42. 10). Pois, boas
amizades potencializam nosso desenvolvimento social (Pv 27. 17) e proporcionam
cura interior (Pv 15. 30). Quem tem amigos sempre se sentirá útil. Os amigos
fazem bem á alma e ao corpo.
Por isso, valorize as
boas amizades e aprecie seus amigos, demonstrando sempre que eles são pessoas
importantes em sua vida. Não brigue por qualquer coisa. Seja flexível. Facilite
seus relacionamentos. Pois quando nos relacionamos bem, damos um importante
passo para sermos vencedores na vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário